sábado, 26 de junho de 2010

Como montei a Fluminense FM, A MALDITA!!!

Essa eu sub-vertí (em goladas demoradas) daqui. Permiti-me algumas correções (não em mim, que não tem jeito, mas no texto, que é muito jeitoso...). ATENÇÃO: a matéria é de julho de 1985!

Por Luís Antonio Mello

Depois que eu e a Somtrês conversamos sobre este artigo, encontrei um amigo na praia de Itacoatiara, um rebelde paraíso situado na cidade de Niterói, Estado do Rio, onde vivo. Eu comentei que estava achando legal a idéia de escrever algumas linhas sobre a Fluminense FM na primeira pessoa. O tal sujeito respondeu que "deve ser difícil falar da própria filha" e coisas do gênero. O fato é que quando o sol se escondeu e o vento leste começava a machucar, peguei o carro e voltei para o centro pensando no artigo, pensando na Fluminense FM. Na verdade, essa história de filha é pura balela. A Fluminense FM foi uma grande mulher.

Uma mulher que nasceu sob o signo dos conceitos e preconceitos fabricados dentro de um mercado voltado exclusivamente para a indústria. A mais doente das indústrias, que é a da pasteurização de idéias.

Quando Samuca Wainer (cuja morte não dá e nem dá para engolir) chegou para mim e disse que estava a fim de fazer uma rádio livre, acrescentei que ela deveria ser ousada, criativa e independente. Samuca tinha um jeitão exclusivo e explosivo de expor idéias, que às vezes alcançavam uma velocidade tão assustadora que sua fala não conseguia acompanhar. Sei que ele falava, eu concordava; eu falava e ele concordava.

Procuramos Ephrem Amora, superintendente do Grupo Fluminense de Comunicação, dono da Fluminense FM, e conversamos. Ephfrem, decididamente, é uma figuraça. Eu, Samuca e ele trocamos idéias sobre dunas de Cabo Frio, pescas em alto-mar, Niterói e, finalmente, rádio. Pedimos para fazer um programa de rock que iria se chamar Revolution. Dias depois, de novo com Ephrem, fomos convidados para fazer uma revolução em toda a programação da rádio. Estamos em dezembro de 1981. Por problemas pessoais, Samuca precisou sair e a equipe inicial da Fluminense por Sérgio Vasconcelos (hoje na Artplan) e Amaury Santos (hoje coordenador da Manchete FM em Salvador) e ainda Alex Mariano (meu sucessor) e Maurício Valladares.

Mas entre dezembro e março, quando a emissora entrou no ar sua nova programação, só estávamos eu, Serginho e Amaury. Seguindo o conselho de um amigo e guru chamado João Luis de Faria Netto, optamos por uma locução exclusivamente feminina. Mais de 100 meninas correram para a porta da rádio quando publicamos nos jornais um anúncio pedindo "locutoras para FM sem experiência, mas com muito inglês". Tinha de tudo entre as candidatas. De física nuclear desempregada a pedicure. Foi uma barra, mas o time inicial acabou saindo. Nessa fase de implantação, o ânimo quase histérico de um personagem chamado Carlos Lacombe (gerente de promoções, hoje na Rede Machete) foi fundamental.

Assim, para resumir, nascia, no dia 1º de março de 1982, a primeira FM empírica do Rio. Quem ligasse o rádio sentia suor, criação, emoção, humor, tentações, gozação, inteligência, carinho, sensualidade... Enfim, a Fluminense FM, A MALDITA, surgia plena como uma mulher de idade desconhecida, cabelos lisos, olhos esverdeados e muito esperta. Essa menina foi recebida a pedradas pelo mercado engravatado, habituado a estilos vamp e cantadas vãs. [a locutora Selma Boiron foi a responsável pela inauguração da rádio.]

Afinal, perguntavam-se: Que estação é essa que chega sem gírias, sem locutores do gênero mela-calcinhas e que não toca nenhum sucesso? Foi uma luta árdua que nosso departamento de marketing (um dia, eu e Lacombe; no outro, Lacombe e eu) teve que enfrentar o que estava no ar. Mas, por sorte, o mercado abrigava cabeças mais abertas como a de Ignácio Machado (diretor do IBOPE), roqueiro inveterado, e muita gente de propaganda que ouvia a Fluminense de cabo a rabo, mas não a programava em suas verbas por motivos até hoje inexplicados.

Mas a mulher estava lá. A cada dia, fisgando pencas e mais pencas dos ouvintes, enfeitiçados com a doçura amarga que todo recado inteligente obrigatoriamente tem que ter. Afinal, fazer rádio não é só botar música para tocar e a Fluminense vivia 24 horas de brainstorms coletivos. Obviamente, reinava a pancadaria entre os profissionais, cada um em busca de algo que pudesse inovar mais. Mas graças a essas pancadarias, o produto ia para o ar mais quente e a mulher aparecia na sacada mais nua e forte.

E, quem diria, aquela saudável e cada vez mais empírica confusão que conseguiria dar forma ao suprassumo do absurdo seria convidada a visitar faculdades de comunicação. Faculdades que iam buscar num modelo empírico de FM respostas aos seus anseios. Os alunos queriam saber detalhes mínimos não sobre o funcionamento da Fluminense, mas sobre beabás de rádios em geral, que sinceramente, julgávamos que seus professores tivessem pelo menos abordado. Algumas perguntas guardamos como pérolas:

* As FMs são eleitas ao vivo?
* Como é que uma locutora só consegue trabalhar o dia inteiro? (Esse aluno não sabia que havia 7 profissionais com vozes parecidas.
* Pode tocar disco em rádio?

Deixei a Fluminense no dia 1º de abril desse ano [1985]. Parecia piada, mas não era. Quando bati minha carta de demissão, a impressão que tive é de que estava deixando uma mulher de verdade após três anos e quatro meses de convivência diária e absolutamente orgásmica. Não foi fácil, mas aconteceu.

O fato é que , na esteira dessa miniemissora que desafiou as mais rancorosas teorias sobre rádio, muitas mudanças já sentimos no mercado. A figura do locutor gostosão está sumindo. As meninas estão, cada vez mais, conquistando seu espaço nos microfones e o rock, pasteurizado, ou não, pode ser ouvido com relativa facilidade num montão de outras rádios. Mais: depois de ter sido dado como morto na década de 70, ressurge no mercado um personagem fundamental chamado produtor. Os produtores estão retornando aos seus lugares, antes ocupados por um bando de contadores de paradas da Bilboard. Rádio é, acima de tudo, uma linha de cultura, uma essência do pensamento contemporâneo e, para mexer com isso, é preciso ter formação, ter vivência, conhecimento de causa.

Se formos trilhar por esse caminho, podemos deduzir que, muito em breve, essa fobia ibopiana vai passar e todas as emissoras irão disputar os primeiros lugares com produtos realmente diferenciados, e não com ridículos listões que abortam a cultura musical dos dias de hoje [ai, ai, ai, Luiz Antonio, cê viu o que aconteceu depois?]. O FM segmentado vai tomar conta e, brevemente - que o diabo seja surdo -, teremos rádios de samba, de rumba, de jazz, de blues, de forró, de entrevistas, debates, enfim rádios para todos os gostos para uma massa humana que está sedenta à cata de novidades. Um beijão, maldita.



P.S. - A criação sempre esteve a serviço da sociedade. Em rádio, a criação está subordinada aos donos do espaço. É hora dos donos do espaço abrirem, sem medos, para os profissionais que acreditam na cultura pura e simples como solução para o tédio devorador de cabeças. Não estranhem os profissionais de criação. Eles parecem estranhos, têm um jeitão meio chegado ao de dono da bola, mas conhecem muito bem o que fazem, ou fazem muito o que conhecem. Não importa. As FMs estão precisando de gás porque, simplesmente, os ouvintes não agüentam mais. Que surjam, realmente, novas Fluminenses por todo País, cada um engolindo uma fatia do mercado. Caso contrário, os dragões eletrônicos, comandados pelos deuses da orgia caótica que pretendem nos transformar em circuitos integrados, vão realmente conseguir transformar informação em informática. E aí, ninguém mais conseguirá segurar. Na medida em que um monte de pequenos e médios donos do espaço cederem à criação, o dragão chegará para trás, pois ele teme as idéias, ele teme o pensamento, a liberdade . Ele morre de medo, creiam. Morre mesmo.
(Revista Somtrês, Editora Três, julho de 1985)


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O documentário "A Maldita", da diretora Tetê Mattos, ganhou o prêmio de melhor-curta metragem do Júri Popular do Festival do Rio. O filme, com 20 minutos de duração, foi feito em película de 35 mm e conta a história de uma lenda vida nascida aqui em Niterói, a Rádio Fluminense FM, a “Maldita”, concebida em 1981 por Samuel Wainer Filho (já falecido) e pelo também jornalista e radialista Luiz Antonio Mello. (leia mais aqui, no final do bloco). Você assiste ao filme no site Porta Curtas, digitando "A Maldita" no campo "ache seu curta". Legalzinho, né?

Nesse revolver de revivals, achei esse papo gostosinho...


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terça-feira, 22 de junho de 2010

'chacomigo, sarja...

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domingo, 20 de junho de 2010

TAMBÉM ACHO!!

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sexta-feira, 18 de junho de 2010

O Débito

(Ouvi, nescios? Demorais...)

Falta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Falta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Falta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Falta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Falta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Falta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.

Falta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Falta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Falta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Falta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Falta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Falta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Falta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Falta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.





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segunda-feira, 14 de junho de 2010

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